outro ângulo

O ângulo de observação que elegemos, pode determinar muito do que enxergamos. Ao olhar qualquer imagem de cima, perde-se alguns detalhes, mas enxerga-se o todo. Ao passo que, a mesma gravura contemplada de perto oferece particularidades que desaparecem quando observada à distância. Nem sempre temos opção de contemplar o interior juntamente com o exterior, o que certamente pode mudar nossa opinião à respeito do que vemos. Em resumo, nossa ótica das circunstâncias passa por filtros internos e externos, por ângulos e nuances que afetam nossa percepção. Por isso, uma mesma situação pode ser discutida e analisada sob diferentes pontos de vista.

Com a globalização da informação, é comum sermos bombardeados por opiniões diversas. Algumas fortalecem pontos de vista previamente estabelecidos e outras os confrontam. Diariamente temos que escolher que nível de ruído permitiremos que nos atinja. Isto é, por mais que seja importante avaliar a situação por diversos ângulos, temos que ser cuidadosos em relação ao que absorvemos de tudo que vemos. É fato que toda moeda tem dois lados. Por isso, em tempos tão polarizados; ao expor nossa opinião, corremos o risco de desumanizar os que de nós divergem. Talvez seja esse nosso maior desafio, já que, é legítima a liberdade de expressão e precisamos aprender a respeitar opiniões antagônicas.

Quando se busca construir uma sociedade democrática e participativa, temos que no mínimo respeitar, para ser respeitados. Ser firme não é sinônimo de ser violento ou agressivo. Não só em nossa nação, que vive um momento de transição muito grande, mas ao redor do mundo as opiniões se dividem. Justamente porque o acesso à informação é globalizado, somos expostos constantemente à análises e pesquisas. São elas que pretendem esclarecer e fundamentar determinados posicionamentos. No entanto, nem sempre existe isenção por parte de quem compila os dados e os divulga. É sabido que até na construção do argumento podemos ser tendenciosos.

“Tudo na vida é questão de perspectiva. Escolha o melhor ângulo.” Marcelo Predebon

Fundamentados na verdade

Diz-se da verdade que ela pode ser relativa. Alguns não acreditam em uma verdade absoluta, e talvez em certos casos ela fique bem nublada mesmo. Contudo, se não existir uma verdade absoluta em relação às principais questões da vida, o caos está instaurado e regulamentado. Instintivamente buscamos esta verdade e perseguimos este padrão. Mas, embora alguns se considerem abertos e flexíveis em suas convicções, elas geralmente encontram-se arraigadas em nosso íntimo, e não nos despojamos delas com facilidade. É de se esperar que nossas escolhas sejam fundamentadas no alicerce que elegemos. Assim como é incoerente negar a existência de tal fundamento. Independentemente de ser sólido ou não, ele existe na vida de cada um de nós.

Foi exatamente esta ordem de coisas que Jesus confrontou. Porque a ótica cristã da vida não tem como objetivo nos isolar do mundo e de opiniões divergentes. Porque, ao contrário do que pensam alguns, ela oferece um posicionamento em relação à variação de perspectivas existentes. Contudo, tal posicionamento não nos autoriza a criticar ou hostilizar quem pensa diferente ou faz escolhas opostas. Somos essencialmente livres para escolher como viveremos nossos dias. Cada um escolhe no que acredita e como se posicionará diante de fatos que lhe são apresentados. Inegavelmente cada um de nós decide se o que contempla são fatos, evidências ou se são apenas pontos de vista distintos. Somos responsáveis por filtrar o que ouvimos e vemos e seremos inconsequentes se imaginarmos que não temos esse dever.

Permitir que nossas ideias sejam confrontadas é um dos meios de fortalecê-las, se a permissão for honesta. Isto é, quando realmente estamos em busca da verdade, não tememos o confronto. No entanto, o rumo deste tipo de abordagem deve ser respeitoso e equilibrado. Quando se perde o controle, e a agressividade e o desrespeito imperam, ultrapassamos um limite importante. Pois, é impossível convencer quem quer que seja à respeito do que pensa, se a pessoa não estiver disposta a nos ouvir. Porque, nenhum argumento ou evidência é forte suficiente para abalar o ponto de vista de um teimoso. Portanto, nestes casos, é muito mais sábio respeitar suas escolhas do que confrontá-las.

A vida falando mais que as palavras

Muitas vezes não conseguimos ouvir o que o outro nos diz, porque suas atitudes estão falando mais alto do que o que pretende comunicar. Esta é também uma verdade que nos afeta. Porque nenhum posicionamento defendido por nós, fala mais alto do que nossa vida. Somos o conjunto de escolhas que fazemos e toda incoerência é percebida facilmente por quem nos observa. Toda inconsistência entre nosso discurso e a prática é testada pelo olhar atento do outro. Este é um esforço que não precisamos fazer, já que instintivamente capturamos estas nuances. O ser humano é muito mais apto a observar do que pode admitir. A análise pode ser subjetiva e até instintiva, mas, em maior ou menor medida, todos possuímos o que classificamos de “feeling”.

Encontrar a verdade absoluta não é sinônimo de vivenciá-la. Inegavelmente anelamos por esta coerência entre o que cremos e o que vivemos. Mas, a distância entre estas duas realidades é o que classificamos como imaturidade ou, em alguns casos, como hipocrisia. Uma pessoa hipócrita é aquela que tem consciência de que seu discurso é diferente de sua atitude. Já os imaturos perseguem honestamente praticar o que classificam como verdade, mas se percebem falhos e em processo de aprendizado. Comumente rejeitamos uma verdade quando ela não está presente na vida de quem a professa, porque buscamos coerência. Esta atitude é legítima, pois, o mundo ideal seria aquele onde toda verdade pudesse ser encontrada na vida dos que a proclamam. Infelizmente, no entanto, isto não é uma regra ou o que acontece na prática.

Por isso, nosso cuidado deve ser redobrado, evitando eliminar o bebê, juntamente com a água do banho. Em nome desta tal coerência podemos desperdiçar o que é legítimo. Pode parecer grosseiro afirmar que isto é possível, contudo, corremos este risco. Especialmente para os que possuem dose excessiva de justiça própria, a chance disto acontecer é eminente. Portanto, quanto menos a sério nos levamos, mais coerente seremos. Já que a sabedoria estará sempre associada a nossa capacidade de aprender e se reciclar. O verdadeiro aprendizado inclui o “desaprender”, e envolve porções consideráveis de humildade. O orgulho nos cega e distancia da verdade. Pois, nos separa interiormente de qualquer confronto, mesmo quando o exterior parece estar aberto. São precisamente estas muralhas de orgulho que ao invés de nos proteger, nos isolam.

“Não existem garantias. Sob a perspectiva do medo, nada é suficientemente seguro. Sob a perspectiva do amor, nada é necessário.” Emmanuel

Nossos mecanismos de defesa

Todos temos mecanismos de defesa, porque o ser humano busca preservação de forma instintiva. Desenvolvemos estes mecanismos por conta de experiências negativas que nos traumatizaram. Qualquer um que tenha sido ferido, fará todo possível para que a ferida não abra, evitando assim que novos golpes sejam desferidos no mesmo lugar. Se assim não fosse, alguns de nós já teriam sido destruídos. Buscar segurança é legítimo e necessário, assim como fugir de tudo que nos violenta. Uma vez que, os que se auto mutilam, não constituem um modelo a ser imitado. Portanto, devemos fugir de qualquer postura que reconheça a tortura ou a agressão como instrumentos de mudança.

No entanto, quando se pretende estabelecer regras saudáveis de comportamento, temos que lidar com tais paradigmas. Contudo, não temos garantia de que a remoção destes gatilhos acontecerá sem dor ou sofrimento. Porque acessar feridas não é indolor. Porém, sempre que recorremos a um especialista, aumentam consideravelmente as chances de sermos bem sucedidos. Apenas quem tem capacidade de nos ver por dentro, sem reservas, pode nos ajudar de forma efetiva. Esta, portanto, não é tarefa para um mero mortal. O especialista que buscamos precisa nos acessar de forma sobrenatural. É neste ponto que a existência de um Deus precisa ser considerada.

Certamente, mesmo que decidamos, de forma legítima, ignorar a existência de um Criador, e optemos por viver sem Ele, estaremos elegendo um deus, que talvez seja nosso eu. Pois, temos uma natureza que precisa de um referencial maior, por isso, buscamos uma verdade que explique nossa existência. Enxergar a vida através da ótica de um Deus que nos ama e que nos criou com um propósito; acrescenta significado e valor à nossa vida. Ao contrário do que afirmam alguns, não é utopia ter fé em Deus. É antes uma necessidade sem a qual nossa vida fica vazia e desprovida de significado. Seja um Deus criador, que formou os céus e a terra, e também nossa vida, ou qualquer outra forma de vida superior que governa o universo, todos temos um deus.

“Quando sua perspectiva está em Deus, seu foco está naquele que vence qualquer tempestade que a vida pode trazer.” Max Lucado

O que é ser cristão?

Por isso, ser cristão é enxergar o mundo e a vida a partir da ótica de um Deus Criador. Este Deus é aquele que criou não apenas o universo e a natureza, mas a cada um de nós. Portanto, possui maior e melhor capacidade de nos decodificar. É também admitir que não nascemos para viver separados ou isolados dEle. É fazer escolhas que sejam coerentes com o que Ele ensinou na pessoa de Jesus. É admitir que sem a cruz nosso acesso ao Pai estava interrompido e que este sacrifício nos incluiu. Ser cristão não é frequentar uma igreja ou simplesmente ler a bíblia e fazer boas ações. Pois, é bem possível que existam pessoas que não se consideram cristãs e que praticam boas obras. Identificar-se com o cristianismo é possuir um relacionamento com a pessoa de Jesus.

Este relacionamento é possível e se traduz na maneira como nos relacionamos com cada aspecto de nossa existência. De modo prático e visível traduz-se na forma com que demonstramos empatia ao sofrimento alheio. Porque foi sempre esta a abordagem de Jesus quando exposto aos conflitos humanos. Ele viu cada um dos que o rodeavam e respondeu de forma prática ao clamor que existia em seus corações. Os que pediram-lhe visão, receberam capacidade de ver. Os que careciam de esclarecimentos foram ensinados. Cada milagre foi liberado de acordo com o que a pessoa necessitava, suprindo uma lacuna. No entanto, Ele foi firme e categórico ao afirmar que era a personificação da verdade, e que não havia outro caminho de acesso ao Pai, fora dEle.

“Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim.” João 14:6

Quer concordemos ou não com a verdade absoluta que Jesus veio proclamar, infelizmente não a encontramos na vida de seus seguidores na medida desejada. Cada um de nós, ao se identificar como seguidor de Cristo, deveria carregar traços de caráter, ousadia e amor que Ele possuía. No entanto, temos que ser honestos ao admitir que a vida dEle está aguada e diluída em nosso DNA, sendo raramente percebida por quem nos observa. Quem dera tivéssemos o suficiente dEle para oferecer respostas para tantas questões que assolam a humanidade, como Ele fez. Este sempre foi Seu desejo, isto é, tocar os homens por nosso intermédio, através de nossas mãos. Enquanto isso não acontece de forma satisfatória, vamos amadurecendo. Gradativamente nos humilhamos mais, para quem sabe algum dia, expressar em nossa vida, a perspectiva dEle.