A primeira associação que fazemos com a palavra limites, assume conotação negativa. Pois, com frequência ela está vinculada a proibições ou fatores inibidores. No entanto, possuir limites, lindando com eles e respeitando o dos outros é saudável. Porque, a ausência deles promove anarquia. Já que, a organização de qualquer sociedade está alicerçada neles. Liberdade é diferente de anarquia, pois nossa liberdade realmente acaba quando começa a do outro.
Mas, mais importante do que reconhecer nossos limites é saber estabelecê-los; respeitando-os. Todos nós possuímos fronteiras, que quando ultrapassadas, danificam um pouco de quem somos. Portanto, demarcar nossa área de atuação e território é imprescindível. Inegavelmente, nosso organismo, assim como nossas emoções, possui limites. Ao extrapolarmos uma capacidade natural, inevitavelmente resvalamos para um território perigoso, onde nossa saúde pode ficar comprometida. Muitas são as razões que nos levam a abrir concessões em relação as divisas que nos protegem.
No entanto, nem sempre temos clareza de onde permitimos a invasão. Já que ela nem sempre é consciente. Nosso subconsciente nos rege bem mais do que gostamos de admitir e é precisamente de lá que recebemos orientações intuitivas. A maneira como reagimos às diversas situações da vida, revela como percebemos a nós mesmos e aos outros. Por isso, o autoconhecimento é tão importante.
“Uma atividade sem limites acaba em bancarrota.” Johann Goethe
Lidando com a insegurança
Assim como é decisivo respeitar limites alheios, precisamos exigir que respeitem nossas fronteiras. Os que não demarcam seu território com clareza, sofrem desnecessariamente. Por isso, um obstáculo importante a ser superado, sem dúvida, é a insegurança. Ela é a principal vilã que devemos derrotar. Certamente ela está misturada com medo, baixa autoestima e preocupação com nossa imagem.
Mas, depois de identificada como fonte de reações inadequadas, que abrem flancos em nossas extremidades, ela pode ser derrotada. Certamente, nossa insegurança está alicerçada em uma identidade frágil que somente nós temos poder de fortalecer. Seja tentando provar ser o que não somos, ou desejando agradar quem quer que seja, jamais deveria ser opção ultrapassar nosso limite. Pois, o caminho de retorno nestes casos é sempre dolorido e pode ser fatal em alguns casos. Isto é, temos que ter clareza que defender nosso território é o que garante nossa integridade.
Porque, limites foram estabelecidos objetivando proteger nosso principal patrimônio – nós mesmos. Contudo, estabelecer limites não é sinônimo de egoísmo e jamais está associado com ausência de empatia. Nenhuma geração sofreu tanto as consequências da falta de limites como a atual. Pois, famílias cada vez menores e mais desintegradas, deixaram de ocupar seu papel fundamental de alicerçar nossas fronteiras. Na tentativa honesta, porém equivocada, removeram as barreiras, deixando jovens, adolescentes e crianças à mercê do acaso.
Resgatando a origem dos limites
Mas, não são os pais os principais culpados, já que eles também são oriundos de uma geração que não interpretou corretamente a importância de fronteiras claras. Ora as demarcações foram confundidas com egoísmo, ora com ausência de liberdade. O resultado destas distorções foi a remoção de parâmetros básicos. Não por acaso, profissionais da saúde mental e física, buscam tratamentos alternativos para pacientes cada vez mais nervosos, portadores de diversas doenças psicossomáticas.
Alguns quadros clínicos podem facilmente ser revertidos com mudanças simples de hábitos, que incluem exercícios físicos e dietas equilibradas. A invasão constante e ininterrupta dos marcos, que deveriam nos proteger dos excessos, gera um desequilíbrio que pode nos custar caro. Quando detectados em estágios iniciais os danos são menores. Mas, a regra tem sido explorar os limites ao extremo, buscando ajuda quando os prejuízos já são irreversíveis.
Abraçar atividades em demasia, ou problemas e cargas emocionais que não são nossas, arruínam nosso sistema. Qualquer equipamento eletrônico ou elétrico, possui um manual de instruções; que estabelece capacidade máxima e mínima. Estas orientações, quando bem observadas, garantem o bom funcionamento do dispositivo. Pois, quem o fabricou, depois de testes, concluiu em que condições ele deve funcionar. Não somos diferentes dos aparelhos, quando o que se analisa são as condições adequadas de desempenho.
Observando os limites
Adentrar territórios alheios é tão inadequado quanto permitir que invadam o nosso. Portanto, é responsabilidade individual e intransferível zelar pela manutenção adequada da sinalização que demarca nosso território. Por vezes essa sinalização está precisando de reparos. Outras vezes ela jamais foi colocada, e necessita ser estabelecida. Seja qual for a circunstância, quando lidamos com limites, conversas e posicionamentos são indispensáveis.
Por isso, ainda que o confronto seja desgastante no primeiro momento, ele representa o princípio da fixação de marcos iniciais. Urgente é, portanto, a relevância de lidar com esta questão que nos afeta profundamente. Alguns se utilizam de subterfúgios que pretendem substituir a conversa direta e objetiva. No entanto, em alguns casos a linguagem não verbal não é suficiente. Todos que possuem dificuldades de verbalizar sentimentos e emoções sofrem efeitos desta ausência de protagonismo.
Um sinal mal posicionado ou que está apagado pode ocasionar acidentes. Por isso, a mesma importância que a sinalização no trânsito ou em lugares públicos possui, é atribuída a nossa linguagem. A localização precisa; está intimamente relacionada a uma sinalização eficiente. Mas, o que é óbvio e esperado em questões práticas nem sempre é aplicado quando envolve nossas emoções. Gostamos de nutrir pensamentos e emoções baseados em nossa percepção, que pode estar lendo errado o que o outro nos comunica.
Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa
Uma das grandes dificuldades; quando se pretende lidar com limites, é saber exatamente onde traçar a linha demarcatória. Frequentemente pessoas fortes e com identidades sólidas são taxadas de grosseiras ou egoístas. De maneira idêntica, rotulamos pessoas frágeis e facilmente manipuláveis como sendo virtuosas. Tais rótulos são concedidos e recepcionados quando existem distorções em nossa personalidade.
Pois, deturpações podem ser sutis ou notórias, mas em qualquer circunstância, denunciam desequilíbrio. Já que, a linguagem não falada de quem não possui limites é mais nociva do que a demarcação clara de um território. Quando se conhece as regras de um jogo, mais facilmente as estratégias de conquista são estabelecidas. No entanto, quando as regras são ignoradas torna-se difícil mensurar o percentual de acerto e de avanço.
Os limites, nada mais são do que o padrão que garante que jogamos de acordo com as regras. Isto por si só não é garantia de vitória. Mas, elimina a possibilidade de desqualificação. Estar no jogo de maneira honesta e conhecendo as regras é o mínimo que se requer de quem deseja vencê-lo. Mudar as regras ou recusar-se a considerá-las, nos desclassifica. Assim como, confundir o que nos protege com o que nos limita é mortal.
Ganhando o jogo da vida
Nosso olhar precisa estar na linha de chegada. Contudo, não podemos chegar de qualquer jeito. Existem orientações mínimas que devemos observar e cumprir. Não é possível negociar o inegociável, e quando o que está em jogo é nossa integridade, qualquer custo é alto demais. Decidir abrir mão do básico em nome de aceitação ou de uma imagem que pretendemos proteger pode ser suicídio.
Atravessar a linha de chegada e receber a informação de que fomos desclassificados; além de frustrante é um desperdício. Temos apenas uma vida para viver e o principal desafio é chegar, cruzando a linha de chegada como vencedor. Os relacionamentos que conquistamos fazem parte do troféu que receberão os vencedores. No entanto, colecionar relacionamentos depende diretamente de nossa capacidade de estabelecer e respeitar limites. Os sábios saberão fazê-lo.
“Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância.” Sócrates
“O homem que sabe reconhecer os limites da sua própria inteligência está mais perto da perfeição.” Johann Goethe