Não há lugar na estalagem

Não há lugar na estalagem foi a frase que Maria e José ouviram quando buscavam um local para dar à luz ao Salvador do mundo. Ainda que seja uma informação que remete ao fato histórico do nascimento de Jesus, nem sempre meditamos na profundidade desta declaração. Pois, nela está contida uma realidade que permeia nosso cotidiano e que sinaliza a direção correta que devemos percorrer. Ou seja, lutar contra o fato de que o lugar que buscamos precisa ser improvisado, perseguido e conquistado foi o que marcou a chegada de Jesus nesta terra.

A gravidez de Maria não teve nenhum glamour, pelo contrário, foi recheada de desafios. O momento que seria celebrado dentro de um casamento e em uma estrutura familiar estável, foi anunciado por um anjo a uma virgem. Assim são anunciados os grandes feitos e momentos da humanidade. Céus e terra se movimentaram de forma intencional e coordenada, mas invisível aos olhos dos que tinham seus olhos apenas nas coisas deste mundo. Desde o princípio a virgem grávida enfrentou preconceito, julgamento e lutou por um lugar que precisava ocupar na vida do menino que nascia. Ela não foi poupada de nenhum nível de incômodo enquanto gerava a criança.

“Maior que a tristeza de não haver vencido é a vergonha de não ter lutado!” Rui Barbosa

O lugar não estava pronto

Depois de uma viagem cansativa, sem experiência, eles improvisaram um lugar que receberia o Salvador – o Criador de todas as coisas. A cena não poderia abrigar incoerência maior quando analisada de forma racional. Pois, sem poupa e longe dos holofotes, alguns pastores e reis se dirigiram ao local e prestaram suas homenagens, dando boas-vindas ao recém-nascido, que viera com a missão de morrer pelo mundo que o rejeitava. Pessoas rejeitaram-no desde Seu nascimento,  depois na vida adulta, traindo-o e negando-o nos momentos que antecederam sua morte. Ele não tinha onde repousar a cabeça, mas sabia que era Filho de Deus. Sua identidade não estava atrelada ao aplauso ou aceitação e sim à Sua origem.

O exemplo que Ele nos deixou é o de que nada nesta terra deve ditar nosso valor ou nos roubar o foco. O lugar que Ele veio ocupar na história e no coração dos homens era o de um Deus que teve coragem de se esvaziar. Abraçou a profissão de carpinteiro e uniu-se a um grupo de pescadores iletrados que aprenderam com Ele a essência da vida. Ele não cercou-se de doutores, mestres e autoridades de sua época. Pelo contrário, os religiosos e governadores não reconheciam em Seus ensinos qualquer veracidade ou razão para o seguirem. O Mestre tinha a Seu lado discípulos que, igualmente, haviam sido rejeitados e que reconheciam não somente em Seu discurso, mas em Suas atitudes a verdade e o norte que buscavam.

“Só é verdadeiramente livre quem está sempre pronto a morrer.” Diógenes

Os discípulos

Atualmente, esta figura polêmica que dividiu a contagem dos anos em antes e depois dEle, possui seguidores. Seu ensino ultrapassou gerações e ainda hoje é proclamado. No entanto, infelizmente, na vida da maioria de seus atuais discípulos a mensagem está aguada e esvaziada de significado. A busca pelo conforto, pela fama, pelo reconhecimento e aceitação passou a ser o alvo da maioria deles. Ao contrário do exemplo deixado, eles também buscam que seu espaço seja reconhecido sem qualquer esforço. São pessoas que, muitas vezes, se negam a abrir mão de privilégios e, também, de improvisar nas circunstâncias adversas.

Não há lugar para você aqui é a frase que os destrói, paralisa, diminui, aborrece, roubando-lhes o foco e a determinação. Esquecem-se que o próprio Jesus deixou-nos o exemplo, alertando-nos para o custo desta escolha. Isto mesmo, o convite não foi para que o reconhecêssemos apenas e sim que o imitássemos. O apelo foi claro – os que quisessem segui-lo deveriam negar-se a si mesmo e tomar sua cruz, dirigindo-se para um lugar de morte. A vida nasceria a partir desta entrega e não antes dela.

“O verdadeiro discípulo é aquele que supera o mestre.” Aristóteles

Antifrágil

Atualmente o termo antifrágil foi incorporado ao vocabulário dos empreendedores e descreve a trajetória de algumas pessoas de sucesso. O menino da manjedoura foi o modelo enviado por Deus para orientar nossa busca. Se existiu alguém que não se fragilizou, nem tão pouco se deixou influenciar pela opinião alheia este, sem dúvida, foi Jesus. Ele foi apedrejado, cuspido, traído, abandonado, mas jamais se abalou ou tirou Seus olhos do Pai. Tinha recebido sua missão do Pai, que hoje também é nosso, sabendo que afastar-se dela não era uma opção. Ele tinha uma causa e um propósito, assim como cada um dos seres criados tem.

O desenho e o projeto eram perfeitos, só estavam manchados e precisavam de resgate. Ele disse sim para o convite de entregar-se para que a restituição fosse aceita e para que todo ser humano pudesse ter esperança. O que se celebra no nascimento de Jesus é o esvaziamento de um Deus. É a encarnação do amor, da verdade e da vida e, também, a revelação de um padrão, de um modelo enviado por Deus à terra. O lugar não estará pronto, ele deve ser conquistado, adaptado e jamais será parâmetro para determinar a importância do evento. Porque, os que não sabem fazer esta leitura do que vivem e dos desafios que enfrentam estão usando a régua errada e, possivelmente, estão distraídos com coisas passageiras, sem valor eterno.

“Quanto maior a armadura, mais frágil é o ser que a habita…” Padre Fábio de Melo